sexta-feira, 18 de outubro de 2013

'CÂNTICO DAS ÁGUAS'




Quem quiser cantar as águas, - as águas do
vasto mundo, - Mar há de, antes, cantar.
Antes das águas nascentes, antes das águas
tombantes, antes das águas correntes, antes das
águas dormentes, viva, no cântico, o Mar.
As águas de fonte fluem flébeis, frescas,
Fluidas, finas, como luz de amanhecer.
As águas das cachoeiras, plasma líquido se
escoando, pela “forma” das cachoeiras vão
passando, vão passando: são o ser e o vir-a-ser.
As águas correntes correm, correm, correm,
corem, correm, turvas, torvas, limpas, claras, -
mas seu destino é parar:
depois de correrem tanto, num ímpeto ou num
quebrando, murmurantes ou silentes, vão se diluir
no Mar.
As águas dormentes dormem, as águas dormentes
sonham, as águas dormentes, fundas, dão
vontade de morrer:
as águas dormentes, fundas, dão saudades do
não ser.
Quem quiser cantar as águas, as águas do mundo
vasto, há de o Mar, antes, cantar:
antes das águas nascentes, antes das águas
tombantes, antes das águas correntes, antes das
águas dormentes, - viva, no Cântico, o Mar.
Porque o Mar é sempre novo, sempre virgem,
sempre em “fiat”, e sempre trágico e antigo, e em
plenitude de ser:
só êle o céu todo espelha, só ele o espírito
espelha, só ele ao homem semelha, - só ele canta
a sofrer . . .


Tasso Da Silveira
In: Poemas De Antes  

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